quinta-feira, 31 de março de 2016

E açim anda-mos nóz a excrever...

Tenho imenssas destas... não se hei-de rir ou xorar. A maior par-te das vezes deçido-me por rir, mas só porque rir é o melhor remédio e  pertantes faz bem ao curação!

quarta-feira, 23 de março de 2016

É que às vezes apetece!

Não Deixe Para Amanhã...

Às vezes, em sítios inesperados, passam pessoas inesperadas na nossa vida que inesperadamente nos marcam. Nem sempre por uma atitude grandiosa, ou por um gesto elevado, mas por pequenas coisas, pequenas palavras, pequenas histórias normais.
Foi o que aconteceu ontem na minha vida, às três da manhã (imagine-se), no hospital onde trabalho. Seja a que horas for que um doente saia da sala de operações, assim que, no recobro, a enfermeira considerar que ele está “bem”, calmo e acordado, manda descer a família para o ver e poder ficar descansada.
O doente que acabou a cirurgia, eram quase três da manhã, tinha 79 anos mas parecia mais velho, magro, com um aspecto debilitado e alguma dificuldade na fala. Quando a mulher dele desceu para o ver, confesso que achei que era a filha. Era uma senhora de 67 anos, e parecia menos. Aproximou-se do doente e começou a falar com ele com um carinho imenso, a dar-lhe beijinhos e festinhas, mas ainda assim continuei a achar que podia ser filha dele.
Eu, que andava por ali, a dar medicação, a fazer medições e registos e a responder às perguntas ansiosas sobre a cirurgia, acabei por ficar apoiada do outro lado da cama, a conversar com ela. Não me atrevi a perguntar qual a relação de parentesco entre os dois mas ela acabou por ma revelar. E começou assim, dirigindo-se a ele:
— Tivemos trinta anos muito bons, não foi António? Fizemos tantas coisas juntos, gozámos tanto a vida...
O doente ia acenando que sim e respondendo no mesmo tom de ternura com que ela falava com ele.
— Nunca casámos... nem vamos casar agora, não é?
Achei que aquela declaração/pergunta não era bem para ele, era também para mim, para eu ficar elucidada. Se calhar ela percebeu que eu estava curiosa. Ou provavelmente não foi a primeira vez que a teve que explicar. E como uma das coisas que mais gosto na minha profissão são as relações humanas que estabelecemos nem que seja por alguns minutos e a possibilidade de, ao conversarmos e brincarmos, podermos tranquilizar um pouco as pessoas que estão numa situação tão fragilizada, perguntei porquê. Ela explicou-me o que todas as pessoas que não querem casar explicam: que acham que um papel pode estragar tudo.
Não me competia discutir o assunto e aliás nem teria tido oportunidade de o fazer porque ela já me estava a contar a história dos dois.
Ambos tinham sido casados antes de se encontrarem, casamentos problemáticos, dos quais tiveram dois filhos cada um. Quando se conheceram, ambos deram devagar os passos que os conduziram um para o outro. Ele bastante mais velho que ela, uma pessoa calma e tranquila “mas um galã, com uma namorada em cada cidade”, ela mais nova, alegre e divertida mas de “pêlo na venta”. O oposto um do outro, mas a verdade é que os opostos se completam.
Acabaram por ir viver juntos com a advertência dela que “Se eu desconfio sequer que há mais alguma na tua vida, nesse mesmo momento estás com as malas à porta! “.
Vinte e nove anos e nenhuma “outra na vida dele” mais tarde, há mais ou menos um ano, ele teve um AVC grave, do qual conseguiu recuperar muitas das funções uma vez que não falava nem andava e hoje, com alguma dificuldade, é certo, mas faz as duas coisas.
Até aqui a história não tem nada de especial, certo?
Especial – pelo menos eu achei – foi o que ela me disse a seguir:
— Sabe? – perguntou – nós os dois tivemos uma vida abençoada. Claro que tivemos os “nossos momentos, as nossas birras” mas sempre nos demos muito bem, e criámos, para além do amor uma enorme amizade. E sabe?, fizemos tudo o que queríamos! Não deixámos nada por fazer, nem deixámos nada para amanhã! Saber que aproveitámos tudo o que se nos deparou, desfrutámos de todos os momentos, hoje que o António está assim, dá-me uma grande tranquilidade, uma grande paz.
Não tenho a certeza da razão porque estas palavras, ditas daquela forma simples e sem pretensões, me tocaram. Talvez porque nós – os outros, a maior parte das pessoas – deixamos tanta coisa para amanhã, não conseguimos gozar hoje e agora, sempre a pensar no que pode acontecer amanhã.
Um amanhã que pode virar a nossa vida do avesso e fazer-nos olhar para trás com pena ou remorso de não termos gozado aquela boa fase, dia, hora ou minutos que a vida nos ofereceu “de graça”.
Um amanhã do qual podemos nem sequer despertar!
Agora, a escrever estas palavras, surgiu-me a ideia que a razão pela qual as palavras dela não passaram por mim sem deixar marcas, foi... um bocadinho de inveja!

sexta-feira, 4 de março de 2016

ORTOTANÁSIA - UMA NOVA MANEIRA DE PENSAR A MORTE



"Cada vez mais, as nossas tarefas serão de acrescentar vida aos anos a serem vividos e não acrescentar anos à nossa vida... dando mais atenção ao doente do que à cura em si mesma."



Se a morte faz parte do ciclo da vida humana, então deveria ser entendida e esperada como o último resultado deste esforço, implícito e inerente desde o princípio. Quando nos esquecemos disso, acabamos por cair na tecnolatria e na absolutização da vida biológica pura e simples. adiando o inevitável, que apenas acrescenta sofrimento e vida quantitativa, sacrificando a dignidade.
O crescente interesse público em torno da eutanásia e suicídio assistido, chama a nossa atenção para os limites do "curar" da medicina moderna.
Referindo-nos sempre ao doente terminal, os profissionais de saúde e os doentes devem saber que é lícito conformarem-se com os meios normais que a medicina pode oferecer, e que a recusa dos meios excepcionais ou desproporcionados não equivale ao suicídio ou à omissão irresponsável da ajuda, devida a outrem.
Essa recusa pode significar apenas a aceitação da condição humana, que se caracteriza também pela inevitabilidade da morte, ou seja aquilo a que se convencionou chamar Ortotanásia.
A Ortotanásia consiste em renunciar a meios extraordinários e dispendiosos, já inadequados à situação real do doente, porque não proporcionam os resultados que se poderiam esperar. Nestes casos pode-se interromper a manutenção artificial da vida quando não há mais meios de recuperá-la devido a uma patologia irreversível.
Muitos bioeticistas, entre os quais Gafo (Espanha), utilizam o termo ortotanásia para falar da "morte no seu tempo certo".
A ortotanásia, ao contrário da eutanásia e da distanásia, é sensível ao processo de humanização da morte e alívio das dores e não incorre em prolongamentos abusivos com a aplicação de meios desproporcionados que imporiam sofrimentos adicionais.
Mas o que é que constitui o prolongamento ilícito da vida e o que constitui um abreviação ilícita da mesma?
Noutras palavras, como é que podemos, por um lado distinguir entre a eutanásia e a distanásia, e por outro lado deixar o doente morrer em paz e com dignidade?
A resposta está na distinção entre os «meios proporcionados e «meios desproporcionados» e no seguinte princípio: não somos obrigados a utilizar meios desproporcionados – sempre e quando respeitarmos os desejos dos doentes – mas estamos obrigados a utilizar sempre «meios proporcionados». .
Utilizar meios desproporcionados sem respeitar os legítimos desejos dos doentes, é distanásia.
Não utilizar ou retirar meios proporcionados é eutanásia

Desproporcionados são os meios cuja carga é superior aos benefícios. São aqueles que são inúteis para conservar a vida do paciente, ou que, para curá-lo, constituem uma carga demasiado grande em termos de dor e sofrimento para o doente. Um doente tem o direito de recusar um tratamento – uma radioterapia por ex. se assim o decidir.
E é ainda preciso ter em conta que um tratamento que é proporcionado para um doente pode ser desproporcionado para outro.
Na aplicação destes princípios devemos actuar caso a caso.
Isto implica que não é possível dar uma lista de meios proporcionados e desproporcionados sem ter em conta o efeito desses meios num determinado paciente, aqui e agora. Em cada caso dever-se-ão valorizar bem os meios pondo em comparação o tipo de terapia, o grau de dificuldade e risco que comporta, com o resultado que se pode esperar de tudo isso, tendo em conta as condições do doente, as suas forças físicas e morais.
Um novo conceito que começa agora a ganhar força. Hellegers, um dos fundadores do Instituto Kennedy de Bioética, a respeito desta questão, afirma: "Perto do fim da vida, uma pretensa cura significa simplesmente a troca de uma maneira de morrer por outra..

É este desafio ético que a medicina e a sociedade, têm que enfrentar com urgência : o de humanizar a vida no seu ocaso, devolvendo-lhe a dignidade perdida.
É o paradigma do cuidar substituindo o do curar que aceita o declínio e a morte como parte da condição do ser humano, uma vez que todos sofremos de uma condição que não pode ser "curada", isto é, todos somos criaturas mortais.

Porque, queiramos ou não, reconhecendo-o ou não, à medida que os serviços de saúde se foram tornando mais dependentes da tecnologia, foram deixadas de lado práticas humanistas, tais como manifestação de apreço, preocupação e presença solidária com os doentes. O "cuidar" surge no mundo tecnológico da medicina moderna simplesmente como prémio de consolação quando o curar não é possível.
Mas cuidar permite-nos realisticamente enfrentar os limites da nossa mortalidade e do poder médico com uma atitude de serenidade praticando uma medicina orientada para o alívio do sofrimento que está sempre mais preocupada com a pessoa doente do que com a doença da pessoa. É sob tal foco, que relação dos profissionais de saúde, nomeadamente os enfermeiros, com o doente, adquire, grande importância.
Cuidar dignamente de uma pessoa que está a morrer num contexto clínico, significa respeitar a integridade da pessoa. Pretende garantir que o paciente seja mantido sem dores tanto quanto possível, que receberá continuidade de cuidados e não será abandonado ou sofrerá perda de sua identidade pessoal. Pretende garantir que o paciente terá tanto controle quanto possível no que se refere às decisões a respeito do seu cuidado e ser-lhe-á dada a possibilidade de recusar qualquer intervenção tecnológica que prolongue a sua "vida", uma vez que será ouvido como uma pessoa com os seus medos, pensamentos, sentimentos, valores e esperanças. Pretende garantir ainda que poderá de morrer onde quiser morrer.

Nesta nova perspectiva deparamos com o difícil desafio, de aprender a encarar o cuidar da vida humana no sofrimento do adeus final, situado entre os dois limites opostos: por um lado a convicção profunda de não matar e por outro, a visão de não procrastinar ou adiar pura e simplesmente a morte.
Por isso é orbigatório reflectir sobre a questão de definir de quando é preciso desistir e aceitar o que é irreversível, intensificando os nossos esforços no sentido de amenizar o desconforto do morrer.
"Curar às vezes, aliviar frequentemente, confortar sempre.” (Oliver) é cada vez mais importante na missão de qualquer profissional de saúde










quinta-feira, 3 de março de 2016

DISTANÁSIA: PROLONGAMENTO EXAGERADO DA VIDA



O termo "distanásia" é pouco conhecido e utilizado na área da saúde, ao contrário da eutanásia, amplamente discutido e estampado nos noticiários e jornais, apesar de sem dúvida, ser uma opção bem menos praticada do que a "distanásia" nas nossas instituições de saúde, nomeadamente nas unidades de cuidados intensivos, as modernas catedrais do sofrimento humano

Distanásia  é etimologicamente o contrário da eutanásia. Trata-se de um neologismo de origem grega. O prefixo grego dis significa "afastamento", e “thánatos”, morte, donde a distanásia significa prolongamento exagerado da vida de um paciente, referindo-se sempre ao doente terminal, perante a eminência de uma morte inevitável.
Outra definição, define distanásia como: "Morte lenta, ansiosa e com muito sofrimento". O termo também pode ser empregado como sinónimo de tratamento inútil.

Trata-se, em suma, da atitude médica que, visando salvar a vida do paciente terminal, atrasa o mais possível o momento da sua morte, usando para isso todos os meios, proporcionados ou não, mesmo que não haja esperança alguma de cura, e ainda que isso signifique infligir ao moribundo sofrimentos adicionais, que, obviamente, não conseguirão afastar a inevitável morte, mas apenas atrasá-la horas, dias ou meses. O que quer dizer que não se prolonga a vida propriamente dita, mas o processo de morrer. No mundo europeu fala-se de "obstinação terapêutica", nos Estados Unidos de "futilidade médica" (medical utility).

Desde a antiguidade, nomeadamente com Platão, Sócrates, e Aristóteles, a vida era considerada como uma aprendizagem da morte, sendo uma das funções da filosofia preparar-nos para uma «boa morte». Supunha-se que aquele que sabia morrer, tinha aprendido a viver e assim a vida e a morte iluminavam-se reciprocamente. Mas não é preciso ir tão longe: basta-nos olhar para a primeira metade do século XX, para constatar que hoje em dia já não se morre como antigamente. Dantes (ontem, ainda) morria-se em casa. Era a morte domada. O ser humano sabia quando ia morrer pela presença de avisos, sinais ou convicções internas. A morte era esperada no leito, e era autorizada pela presença de parentes, vizinhos, amigos e até crianças. Havia uma aceitação dos ritos, que eram compridos sem dramatização. Era algo familiar, próximo, em que os que a aguardavam – doentes e familiares – se conheciam muito bem e partilhavam valores. Assim podiam dar ao moribundo todo o conforto – nos seus variados aspectos – que alguém no limiar da vida, tanto necessita.
Pelo contrário, hoje, praticamente a quase totalidade das mortes ocorre no hospital. A hospitalização, as unidades de cuidados intensivos e os transplantes, alteraram radicalmente o conceito de morte e de morrer. O desenvolvimento da tecnologia, as técnicas e procedimentos que dão aos profissionais de saúde novos poderes para retardar ao máximo a hora da morte, levaram-nos a uma interpretação errónea de que a morte pode, quase sempre ser adiada.
E quanto mais de ponta for a instituição de saúde, tanto mais possível e sofisticada pode ser a Distanásia, embora, seja importante assinalar que nos hospitais dos países mais desenvolvidos existe uma consciência bem mais lúcida de limite, ao nível do investimento tecnológico na fase final da vida. Na cabeceira das camas dos doentes irrecuperáveis constam indicações tais como NR (não ressuscitar), pedidas pelos próprios doentes quando estão (ou estavam) ainda lúcidos.


À primeira vista, poderíamos ingenuamente pensar que a morte nas mãos da moderna tecnologia médica seria um evento menos sofrido, e mais digno do que o foi na antiguidade: não temos maior conhecimento científico, analgésicos poderosos, que aumentam a possibilidade de controlar a dor, máquinas mais sofisticadas, capazes de substituir órgãos que entram em disfuncionamento?
Não temos maior conhecimento psicológico, um instrumento precioso no sentido de aliviar as ansiedades e o sofrimento de uma morte antecipada? 
Não temos exactamente tudo, o que necessitamos para tornar realidade, a possibilidade de uma morte digna e em paz?
A resposta pode ser sim e não. Sim, temos muito mais conhecimento que tínhamos anteriormente. Mas não, este conhecimento não tornou a morte um evento digno. O conhecimento científico e tecnológico serviram também para tornar a nossa morte mais problemática, mais difícil de prever, mais difícil ainda de lidar, fonte de complicados dilemas éticos e escolhas dificílimas, geradoras de angústia, ambivalência e incertezas.
A medicina cujo objectivo é a busca da saúde, procurando aumentar o tempo de vida e a sua qualidade, fomentou implicitamente um culto idólatra da vida, organizando a sua fase terminal como uma luta a todo o custo contra a morte e alimentando a tendência para prolongar a vida em condições inaceitáveis.
Esta idolatria da vida ganha forma na convicção de que a inabilidade para curar ou evitar a morte, é uma falha da medicina moderna. A morte é admitida com relutância, encarada, a barreira que lhe permite para atingir os objectivos.
A falácia desta lógica é que a responsabilidade de curar termina quando os tratamentos se esgotam.
É necessário que se reconheça que em alguns casos se chega a um ponto em todas as vidas, em que nada pode ser feito em benefício dos doentes, excepto mantê-los confortáveis e sem dores porque no fim, a morte acaba por chegar e vencer.
Convém a todos os profissionais de saúde cuja formação é totalmente virada para a manutenção e preservação da vida a qualquer custo, reflectir sobre o sofrimento que inutilmente se acrescenta a uma agonia programada por uma terapêutica já inútil e somente utilizada para cumprir o dogma médico de "fazer tudo o que for possível para conservar a vida" - o qual, interiorizado de maneira acrítica por alguns, é aceite como princípio ético que não exige maior discussão e normalização. Se a morte faz parte do ciclo da vida humana, então deveria ser entendida e esperada como o último resultado deste esforço, implícito e inerente desde o princípio. 
E quando nos esquecemos disso, acabamos por cair na tecnolatria e na absolutização da vida biológica pura e simples. É a obstinação terapêutica adiando o inevitável, que apenas acrescenta sofrimento e vida quantitativa, sacrificando a dignidade com que nos assiste na morte. 



quarta-feira, 2 de março de 2016

"Quando calha" não é uma forma de organização!


Portanto já trabalhei com um horário fixo. É fácil, com um horário fixo, Termos rotinas e organizarmos a lida da casa. Às segundas é dia de aspirar a casa, às terças é dia de ir às compras, às quartas... É por aí fora.
É também já trabalhei por turnos, manhã, tarde noite, numa sucessão organizada e sempre igual. Não é tão evidente, mas também não é muito complicado organizarão-nos para que as coisas corram mais ou menos a jeito. Quer dizer, pode-se estabelecer que as manhãs dos dias em que se faz tarde, se vai às compras, ou se mudam os lençóis da cama ou qualquer outra coisa que decidamos fazer.
Agora, quando se trabalha a dias a coisa Fia mais fino!
Por mais que se estabeleça que na próxima quarta feira é o dia de arrumar a estante que está pela hora da morte, pode perfeitamente acontecer que na terça nos telefonem a dizer, que precisam de nós no hospital nesse preciso dia, a partir das oito da manhã e até à hora que for. E quando se trabalha a dias nãos se diz que não a um dia de trabalho! Aceita-se tudo o que vem à rede!
Ou seja qualquer veleidade de ter uma rotina, um horário, uma programação, é mais ou menos inútil. Por isso De repente dei por mim sem manteiga em casa. Ou a não comer sopa há três dias porque não há legumes no frigorífico. Ou com falta de detergente da loiça. Isto nunca me tinha acontecido!
E que não se pense que este é um assunto de somenos importância.
Ora vejamos o que implica a lida da casa:
- Limpeza: aspirar (uma ou duas vezes por semana porque eu cá acho que com estes novos aspiradores xpto, o ambiente de nossa casa fica tão asséptico que o primeiro vírus que por acaso entra nos deixa de cama sabe-se lá por quanto tempo), limpar o pó (mesmo que seja só umas assopradelas para cima dos móveis), lavar chão, casas de banho, etc. e não falo do pó que se acumula alegre e continuamente por cima dos armários, que esse será limpo uma dia, só não sei é quando.
- Compras: sim, eu sei que há produtos que podemos comprar ao mês, o detergente para a máquina da loiça e essas coisas. Mas e os ovos? Os frescos. O PÃO! O pão!! E o leite!
- Cozinha: sim, também sei que o congelador e o microondas são uma ajuda preciosa para a mulher moderna. Mas mesmo a mulher moderna tem que meter qualquer produto lá dentro para que eles sirvam para alguma coisa. O que se prende, não só com o ponto anterior - compras - como com o tempo que a cozinha demora, porque apesar da minha impaciência que impedirá sempre que eu seja boa cozinheira, um guisado não fica pronto mais depressa por causa dela. Mas não é tudo: há ainda com a gestão dos jantares e almoços familiares, outro problema com que me deparo. Se me esqueço de tirar do congelador o almoço de amanhã, já sei que tenho missa cantada, porque não ligo nenhuma ao bem estar familiar, que as crianças (homens feitos e direitos que já passam dos vinte anos) saem de casa sem tomar o pequeno almoço, que toda a família anda basicamente a passar fome e tudo por causa desta minha ideia peregrina de trabalhar a dias! Um drama em três actos!
Como vêem, não é simples e para dizer a verdade toda a gestão da minha casa e da família vão sendo feitos quando calha. Ora "quando calha" não é maneira de se viver.
E por isso este post.
Para partilhar a minha angústia pela falta de organização em que me vejo envolvida e afirmar que qualquer ajuda/ideia para organizar a minha desorganização, será bem vinda.
Sintam-se à vontade mesmo que seja para escrever tantos disparates como eu.

O Direito de Morrer

Ontem voltei a ver, na televisão, o filme «De quem é a vida afinal?». 
Nele, um escultor, após um acidente de trãnsito fica paralisado do pescoço para baixo e, com graves lesões renais, é obrigado a fazer todos os dias, diálise. Sabendo que no dia em que tiver alta morrerá, e porque o médico que o segue, se recusa a dar-lhaempreende uma batalha jurídica nesse sentido. Independentemente da sua razão,impressionou-me o discurso que ele faz ao tentar convencer o juiz que tem direito a dispor da sua vida e que passo a transcrever:
» Sinto-me profundamente ultrajado por vocês (pessoal da saúde) sem me conhecerem, terem o poder de me condenar a uma vida de tormento porque não podem ver a minha dor, não há sangue, não há choros, não vêm o que não está à vista…»
Tal como uma moeda tem dois lados, o progresso da ciência, se tem aspectos extremamente positivos, tem alguns verdadeiramente assustadores nomeadamente no que diz respeito à medicina em que surgem problemas éticos muito difíceis de resolver.
Um deles tem a ver com o direito a morrer
A minha opinião pessoal sobre o assunto não cabe aqui, mas ainda estou em dúvida sobre o nome que hei-de dar ao acto que este personagem, ao obrigar os médicos a darem-lhe alta, está a praticar: suicídio? Eutanásia? E não será que o médico ao impedi-lo de sair do hospital – pelas mais nobres razões – estará a praticar o que hoje em dia se chama Distanásia que, embora seja praticada muito mais frequentemente do que a eutanásia, poucas pessoas sabem o que significa?
A distanásia (do grego “dis”, mal, algo mal feito, e “thánatos”, morte), consiste em atrasar o mais possível o momento da morte usando todos os meios ainda que não haja esperança alguma de cura, e ainda que isso signifique infligir ao moribundo sofrimentos adicionais que, obviamente, não conseguirão afastar a inevitável morte, mas apenas atrasá-la umas horas ou uns dias em condições deploráveis para o doente, como aconteceu em casos famosos como o de Truman, Franco, Tito, Hirohito e Tancredo Neves.
Basta pensarmos um bocadinho no assunto para constatar que hoje em dia há mil e uma  técnicas e procedimentos que dão aos profissionais de saúde o poder de retardar quase ad eternum a morte dos seus doentes.
Preocupamo-nos tanto em preservar e/ou manter a vida dos nossos doentes que muitas vezes, talvez mesmo a maior parte delas, não conseguimos saber quando devemos parar, mesmo contra a vontade expressa desses mesmos doentes.
É evidente que é extremamente difícil saber qual é o tempo certo, o momento correcto, para pura e simplesmente não fazer mais nada e deixar a natureza seguir o seu curso, deixando o doente morrer em paz com a dignidade que qualquer pessoa merece.
Mas há de facto uma hora certa, uma hora em que é necessário desistir, aceitar o que é inevitável. Esse momento, para o qual também hoje em dia já se arranjou um palavra – ortotanásia – é teoricamente o meio termo entre a apressada eutanásia e a obstinada distanásia.  
No entanto, para todos os profissionais de saúde, cuja formação é totalmente virada para a manutenção e preservação da vida a qualquer custo – ou quase -  a morte constitui uma derrota pessoal, quase uma afronta  a toda a nossa sapiência e aos esforços que, ao longo dos tempos,foram sendo feitos para termos cada vez mais meios de diagnóstico, mais máquinas, mais medicamentos, que impossibilitem essa bruxa horrorosa toda vestida de pretode chegar perto dos nossos doentes e os levar.
E apesar de lidarmos com a morte, ous com a possibilidade dela, todos os dias, esta dá-nos a medida da nossa impotência, e acima de tudo da nossa fragilidade ao lidarmos com ela. Porque nas nossas escolas nos ensinam muitas coisas, mas entre elas não está a capacidade de conviver com a angústia dos que inevitavelmente vão morrer. 
É provavelmente esta incapacidade que faz com que nós técnicos de saúde, nos couracemos na «insensibilidade» de que se queixam os doentes, supondo que é a única forma de nos protegermos do sofrimento de alguém que está ao nosso lado e, pior, ao nosso cuidado, impedindo-nos de os ajudar a mitigar as suas dores, nem que seja deixando de fingir que não ouvimos cada vez que algum doente diz qualquer coisa mais embaraçosa como «’Não quero mais viver assim» 
É provavelmente esta incapacidade – que é extensível a todas as pessoas – que nos impede de enfrentar em última análise, que nós próprios não somos eternos – como julgamos no dia a dia - e que um dia a morte – transformada num tabu na sociedade moderna – também nos baterá à porta.