domingo, 10 de julho de 2016

NUNCA MENCIONE A PALAVRA "S"

Se não quiser começar uma guerra, nunca, mas nunca, mencione a palavra "S" no meio duma frase, em frente duma enfermeira, durante um turno. Qualquer enfermeira sabe o que se segue a "Está tudo Sossegado agora...": o caos!
Se perceber que o turno está a correr pacificamente, guarde esta opinião para si mesmo, a bem da continuação duma convivência pacífica com as suas colegas!
(nursebuff.com)

domingo, 8 de maio de 2016

VIVER INTENSAMENTE... OU NÃO.

"... Fitámos-nos um ao outro, e a intimidade entre nós ia-se tornando demasiado profunda - como se fossemos ambos cair lá dentro sem nunca conseguir sair. É esquisito como a vida tem que ser vivida á tona das coisas. Se assim não fosse a nossa consciência seria assoberbada pelas pequenas despedidas e mortes que vivemos todos os dias." (Goa ou O Guardião da Aurora - Richard Zimler)

Esta frase despertou-me para uma coisa em que, sem ter muita consciência, já tinha pensado. Não profundamente. À tona. Não, não se assustem, não pretendo escrever um tratado sobre viver a vida superficial ou profundamente, mas apeteceu-me deter-me um bocadinho sobre isto.
É óbvio que não podemos viver todos os minutos da vida profundamente.
Não é que em algumas circunstâncias não queiramos. Queremos viver a paixão o mais intensamente possível e durante o maior espaço de tempo possível. Queremos sentir aquele fogo no estômago, aquela ansiedade que nos aperta a garganta cada vez que o nosso telemóvel vibra ou emite um som, seja de mensagem, de email, ou mesmo de toque. O coração salta-nos antes de vermos quem está do outro lado e chegamos a atrapalharmo-nos a passar com o dedo pelo ecrã, correndo o risco de desligar a chamada. Queremos ficar a olhar para a outra pessoa ad aeternum, nem precisamos de dizer coisa nenhuma, só sentir o formigueiro percorrer-nos de alto a baixo cada vez que ela nos toca. Um dia, e outro e outro...

Mas existe o reverso da medalha: o desgosto profundo causado por exemplo, pela perda definitiva de alguém. O mesmo fogo no estômago, a mesma ansiedade que nos aperta a garganta, o coração a bater descontrolado. Tudo igual mas de sinal contrário. Um dia e outro e outro... Só queremos que passem depressa, muito depressa, para não estarmos sempre a pensar no pesadelo porque estamos a passar, tão profundo que não conseguimos imaginar como é que algum dia poderemos voltar a viver, e sentir "menos" ou a sentirmo-nos melhor.
Eu sempre achei que, para viver a 100%, o que tinha que fazer era sentir muito e muitas vezes.
Mas parece que não, que maior parte do tempo, vivo, como todas as outras pessoas, à tona, com medo de me afogar em sentimentos que obviamente abafo e que me permitem NÃO sentir "as pequenas despedidas e mortes que vivemos todos os dias". Pensando bem, muitas vezes enterro a cabeça na areia para não ter que ver o que me faz sofrer.
Mas e as pequenas alegrias e prazeres que também acontecem todos os dias? Aquelas pequenas coisas que nos são agradáveis, desde estar sentado a olhar para o mar até ao enorme prazer que é ter os braços dos nossos filhos pequenos à volta do nosso pescoço, passando por comer uma laranja com o sumo a escorrer pelo queixo e não me ralar?
Acho que o segredo é, sempre que possível, dar mais valor a essas pequenas alegrias e prazeres, vivê-las um bocadinho mais intensamente do que as dores, para que a balança penda para o lado da felicidade. E essa é uma atitude que implica um treino. Que, como qualquer treino tem que ser praticado dia-a-dia
Senão não resulta.
E eis-nos infelizes... mesmo que seja á tona das coisas.








quarta-feira, 4 de maio de 2016

NEM MAIS UM SÓ CICLISTA NA MARGiNAL!

O ciclsmo está na moda!
Como aliás o desporto em geral.
E em particular o desporto ao ar livre: marcha, corrida ciclismo...
Parece-me bem. Parece-me mesmo muito bem! Até gosto de os ver com aquelas malhas justas e capacetes em forma de lágrima a pedalar dum lado para o outro.
Já o que não me parece tão bem é que os ciclistas pedalarem em plena marginal! Porquê? Porque vamos nós descansados, a uma velocidade controlada pelos radares que não ultrapassa os sessenta, setenta km/h e de repente, sem que nada o faça prever, levamos com três ciclistas pela frente. Velocidade máxima uns vinte km/h.
Circulam eles na faixa da direita?, perguntar-me-ão. Sim, circulam.
Circulam o mais à direita possível na faixa da direita, junto ao passeio tentando facilitar a vida aos carros que circulam na mesma direcção? Definitivamente não!
Passeiam-se pelo meio da dita faixa, nas calmas, mesmo que nos pareça que estão a pedalar esforçadamente. Como é que se percebe isto? Porque nunca vão em fila indiana. Vão aos pares, quando não aos três, lado a lado.
Ora encontrar um ou mais obstáculos, que se deslocam a vinte km/h quando nós nos deslocamos a sessenta, implica uma de duas: ou estamos com sorte e não temos nenhum carro atrás de nós na faixa da esquerda e podemos ultrapassa-los sem problema, ou, o que acontece na maioria das vezes, assim que os avistamos começamos a travar a fundo correndo sérios riscos de outra de duas: ou levar com o carro de trás em cima, ou levar de arrastão os obstáculos que se apresentam à nossa frente. Nenhuma delas é agradável, uma porque provoca graves lesões na carroceria dos dois carros envolvidos, a outra - no meu entender, a pior - porque pode provocar graves lesões nos obstáculos, com tudo o que isso implica de ambulâncias, hospitais, cirurgias, convalescenças, dores, polícias, seguros e segurados,entendimentos ou desentendimentos, enfim, uma trapalhada!
De notar que nos dias de hoje há ciclovias em grande parte do caminho entre a Ponte Vasco da Gama e Cascais, e quando elas não existem, há passeios que sim, são estreitos e não permitem que vão lado a lado nem sequer duas bicicletas, quanto mais três, mas estão normalmente desimpedidos (se exceptuarmos um ou dois corredores (de gente que corre) que podem perfeitamente competir com os ciclistas em termos de velocidade).
Reparem na civilidade deste ciclista a deixar a estrada completamente livre para os automóveis!  
Assim decidi iniciar uma cruzada contra os ciclistas na Marginal.
Penso começar com um ou dois cartaz com os dizeres "NEM MAIS UM SÓ CICLISTA NA MARGINAL", ali para os lados de Paço de Arcos - meio caminho entre Oeiras e Algés, onde os podemos encontrar com mais frequência.
Se os nossos deputados perdem o seu tempo, TEMPO QUE EU PAGO, a discutir anormalidades como achar uma discriminação um mero cartão de cidadão poder ser conotado apenas com o sexo masculino e nós, pobres mulheres, podermos ser ou ficar menos gente, por isso, eu também posso insurgir-me contra aquilo que considero um atentado à segurança rodoviária!
Ainda não fixei o dia, mas se quiserem juntar-se a mim, deixem recado aqui mesmo, que assim que decidir o dia e a hora, aviso. UNIDOS VENCEREMOS!


segunda-feira, 25 de abril de 2016

O ATORMENTADOR



Um destes dias, em conversa, um amigo disse que "...o problema do Carlos é ter um atormentador..." Sem perceber o que é que ele queria dizer com isso, perguntei-lhe o que era um "atormentador". "É um conceito que eu aprendi com o meu pai: ele ensinou-nos que, na nossa vida, não podíamos deixar que houvesse um atormentador. Que é obviamente alguém que nos atormenta e que nós deixamos que nos atormente ao não esquecermos o que nos fez. E se é assim, passamos muito do nosso precioso tempo, grande parte da nossa vida, a pensar nele. A sentirmo-nos vítimas, a odiá-lo, a congeminar a forma de nos vingarmos do tormento por que ele nos faz/fez passar. A atormentar-nos!" 

Nunca tinha pensado nisto, mas faz-me todo o sentido. Quantas vezes deixamos que haja um "atormentador" que faz com que a nossa vida gire à sua volta? Que faz com que cá dentro, naquele ponto mesmo abaixo do esterno, haja um ponto de fogo que faz doer?
Quando somos agredidos, seja de que maneira for, é evidente que ficamos sentidos. Quem não sente não é filho de boa gente. Mas há um tempo para sofrermos com a agressão, mesmo que ela tenha sido grave.
Num tempo que, claro, cada um sabe qual é, sofremos, fazemos o luto, e seguimos em frente.
Tem que ser. Não só porque enquanto estivermos ligados ao passado, não conseguimos viver o futuro, como também, e principalmente, porque se não conseguirmos desligar-nos, estamos a dar ao nosso "atormentador", poder. PODER sobre nós e sobre a nossa vida.

domingo, 24 de abril de 2016

SEGREDOS

Esta foi uma semana em que não aconteceu nada. Quer dizer, aconteceu, mas é segredo. Proibiram-me de dizer uma palavra que fosse sobre o assunto. Por isso eu não posso dizer nada. Não é que não me apeteça. Apetece. Quando temos coisas boas - ou que podem vir a ser boas - para dizer, ficamos em pulgas para as contar, não é? Eu pelo menos fico! Só que não posso dizer nada porque disse que não dizia. Assim, eis-me aqui mortinha por contar tudo acerca da minha vida e a ter que ficar calada.
A partilhar com os desgraçados dos meus leitores esta angústia, para que eles também fiquem um bocadinho irritados por eu não dizer aquilo que aconteceu esta semana e de que eu não posso falar. Porque, desenganem-se se pensam que eu vou contar o que quer que seja. Não vou. Eu sou boa a guardar segredos, mesmo que queira muito contá-los.
Pode ser que para a semana possa dizer-lhes alguma coisa....
Até logo.

quinta-feira, 21 de abril de 2016

AS MIL E UMA MANEIRAS DE PEDIR UM CAFÉ

Não deve haver muitas coisas que tenham tantas e tão variadas formas de se pedir como o café. Basta sentarmo-nos numa esplanada ou à mesa de um café —  casa comercial onde servem cafés, bagaços e bolos e que também costuma ter cigarros mas agora, com esta febre não fumadora que se apossou do mundo, algumas deixaram de ter — e ir ouvindo a maneira como as pessoas o pedem.
Parece-lhe que, à partida, parece que este é um tema simples e consensual?
Não é.
Tal como muitas outras coisas que nos parecem lineares e, um dia, descobrimos que são mais complicadas do que à primeira vista dão a entender, pedir um café e ser entendido pela pessoa que nos atende, é uma ciência. Não é nada fácil aprendê-la e pô-la em prática e, sobretudo, não é qualquer um que pode estar atrás dum balcão a servir cafés. Se por acaso isso acontece, no fim, vai-se a ver e a casa comercial foi à falência, muito por culpa do mau desempenho dos empregados...
Para que isto não aconteça, antes de se passar alguém para trás de um balcão, há que investir na sua formação, palavra que, para além de estar na moda, dá outro status ao estabelecimento.
Além disso, com sorte, ele ainda há por aí um subsidiozito da Europa, esquecido em qualquer gaveta, é uma questão de se perguntar às pessoas certas e a tal formação sai-lhe de graça ou, na melhor das hipóteses ainda lhe pagam por cima!  
Ora imagine-se a dizer:
— Abri este café após me ter formado, com distinção, no curso «As Diversas Maneiras De Pedir Um Café e Ser Correctamente Atendido». Tive a melhor nota de 2016!
Lindo, não é?
Ou:
— Este meu empregado não é qualquer um... é formado em cafés e chás das melhores procedências!
Não é nada preocupante se o seu empregado ou você, como dono do café, trocar os grãos do cafés propriamente ditos, ou seja, se em vez da mistura de cinquenta e três por cento Brasil e quarenta e sete Quénia, der outra qualquer, tipo: vinte e dois por cento Tanzânia, sessenta e seis São Tomé e doze Venezuela.
A maior parte das pessoas tem o céu da boca de lata – como dizia o meu pai – e não vai dar por nada.
Basta fazer um ar convicto que elas engolem o café que lhes saiu na rifa com um sorriso conhecedor e no fim ainda dão estalinhos com a língua e comentam para quem as quiser ouvir: “Isto sim, é um bom café!” 
O que, isso sim, é imperdoável, é não saber traduzir as mais diversas formas de um português de gema lhe pedir um café!
Um português de gema tanto pode ser de Trás os Montes como do Baixo Alentejo, entenda-se. Agora, vá um lisboeta ao Porto e peça uma bica! Algum portuense percebe que o que queremos é um café? Não. E mesmo que saibam perfeitamente o que queremos dizer, aqueles bairristas fazem-se de mulas: Tal como em Roma temos que ser romanos, no Porto temos que ser portuenses... eles estão no seu direito. Nós, os mouros do sul, também não temos que saber que, quando um deles nos pede um simbalino, o que ele está a pedir é apenas e só um café.
Mas não é necessário andar pelo país fora para recolher maneiras de pedir um café. Eis algumas maneiras que eu coligi nos vários cafés do meu próprio bairro:
Uma bica,
Um café.
Um cafézinho,
Uma bica,
Um café expresso,
(Até aqui tudo bem)
Um café cheio,
Um café pouco cheio,
Um café meio cheio,
... Desculpe... não tão cheio!
Curto,
Comprido,
Um café em chávena fria,
Um café  em chávena aquecida – quer dizer bufada pelo vapor, percebi ao ouvir este pedido. Estava convencida que as chávenas em que se servem os cafés estão normalmente quentes... mas não,
Uma italiana,
Um carioca,
Um descafeinado
Um descafé,
Um dêcá... (se me pedissem um descafeinado desta maneira eu punha a mão na anca e perguntava logo: dê cá o quê? E depois era despedida...),
Um café pingado,
Um café baptizado,
Um café sem princípio,
Um abatanado (não faço ideia do que é isto!),
e o tal simbólico.
Depois há os mais finos, estrangeiros.
Um capuchino
Um irish coffee.
Isto já para não falar de cafés com leite que são outra fonte de inspiração:
Café com leite escuro... mais moreno...
Café com leite, claro...
Uma meia de leite...
Um galão...
Um garoto...
...
Tenho ou não razão?
Às tantas um curso de formação é para os mais expeditos... para os outros, menos... inteligentes, digamos,  pode ser que sejam precisos mais alguns cursos e mais intensivos.
É o que eu acho.


Até logo.

quarta-feira, 20 de abril de 2016

AS MINHAS CRÓNICAS

Há uns anos, e durante uns anos, escrevi semanalmente para a Olá Semanário, umas crónicas que só tinham a ver comigo. Quer dizer, escrevia sobre o que me apetecia, que é, na minha opinião, a única e mais divertida maneira de se escrever. Tanto podia ser sobre qualquer coisa que tinha acontecido em minha casa e com algum membro da minha família - como quando escrevi sobre a relação estreita dos mosquitos com o meu marido -, como sobre alguma ideia mais ou menos metafísica que me ocorria no momento. Ocorriam-me muitas, nessa altura, pressionada pela Dulce Varela, a directora da Olá Semanário (Saudades, Dulce) que queria sempre as crónicas para ontem.
Uma das que mais gostei de escrever já a transcrevi aqui: É o post de dia 9 de Abril que tem como título "Projectos". Estou absolutamente convencida que poucas pessoas o entenderam e pensaram mesmo nunca mais "porem os pés" neste blog. Compreendo-as. Eu própria o faria, no vosso lugar. 
Mas na altura andava irritada com alguns iluminados, pessoas muito inteligentes e cultas que são incapazes de ler o que o comum dos mortais tem prazer em ler, e escrevem em consonância, ou seja, coisas que ninguém entende. Assim escrevi aquela crónica para experimentar como era ser como eles. Deu-me um trabalhão, não julguem que não! Quem é que sabe o que são formas "puerpro-centradas"?? Felizmente, nessa mesma altura estava a fazer uma formação no hospital e um dos prelectores falava assim. Foi uma sorte, porque ao mesmo tempo que ia ouvindo o que ele dizia, ia escrevendo todas as palavras ou expressões caras que ele ia dizendo e pedindo explicações sobre as mesmas, o que, também percebi, irrita quem tem que descer ao nosso nível, para nos explicar coisas que são absolutamente óbvias.
Devo confessar ainda outra coisa: aquela crónica deu-me imenso jeito quando fiz o meu complemento(1), porque a primeira coisa que nos pediram foi para escrever um artigo sobre o que quiséssemos. Acontece que no primeiro dia, na primeira aula, eu tive uma acesa troca de palavras – uma discussão (2), para ser franca – com o professor, sobre o assunto: “a inconveniência e a estopada de ter que ouvir palavras, expressões, frases inteiras ininteligíveis, sabe-se lá porquê e para quê, uma vez que ninguém as percebe” .
Com uma ou outra modificação para parecer uma coisa muito séria, apresentei o “artigo” que tive que provar ter sido eu própria a escrever, uma vez que o professor não acreditou nisso (3).
Portanto, apesar de ter chegado à conclusão que ser como os intelectuais não era, de todo em todo, a minha vocação, escrever aquele artigo foi divertido e deu-me jeito.
Outra crónica que gostei muito de escrever foi sobre as mil e uma maneiras de pedir um café. Que as há. E esse sim, é um post que toda a gente vai perceber. 
Mas como este já vai longo e a noite já não é uma criança, isso fica para amanhã.
Assim como assim, posso usar algumas estratégias  para deixar os meus “caros leitores” com água na boca...
Até logo.


(1) Para quem não é “da arte”, o complemento foi um ano em que os enfermeiros tiveram que voltar para a escola para passarem de bacharelados a licenciados.

(2)  Esta discussão valeu-me a amizade incondicional de todos os meus colegas que também não estavam a perceber patavina do que era suposto estar a ser-nos ensinado.

(3)  Devo dizer que nos fim do complemento, ele e eu éramos os maiores amigos! Acontece-me muito: primeiro pego-me com as pessoas e ao fim de algum tempo, somos unha com carne.

sexta-feira, 15 de abril de 2016

Mulheres



Elas sorriem quando querem gritar
Elas cantam quando querem chorar
Elas coram quando estão felizes
E riem quando estão nervosas

Elas brigam por aquilo em que acreditam
Elas levantam-se para a injustiça
elas não levam "não" como resposta quando
acreditam haver uma melhor solução

Elas andam sem sapatos novos
para suas crianças poderem tê-los
Elas vão ao médico com uma amiga assustada
Elas amam incondicionalmente

Elas choram quando suas crianças adoecem
e se alegram quando suas crianças ganham prémios.
Elas ficam contentes quando ouvem sobre
um aniversário ou um novo casamento.

Pablo Neruda
http://avossemnos.wix.com/avossemnos

Para continuar bem a semana

what else?

sábado, 9 de abril de 2016

Projectos

A interdisciplinaridade de que a sociedade vem dando mostras, configurando relações participativas, o reforço do processo de sociabilização dos diversos actores intervenientes em cada sector da nossa vida, pressupõe a consciencialização, o dinamismo do inter-relacionamento, a discussão dos caminhos, e a persecução dos objectivos tendo em conta, a componente motivacional, assim como o desenvolvimento sócio-moral, que se vai repercutir neste todo holistico,
potenciando assim os resultados em vista.
Um dos principais motivos da crise em que o mundo dos dias de hoje se vê mergulhado, consiste na incapacidade de mobilizar as virtualidades criativas das pessoas, porquanto se continua a fazer um apelo ao aumento da qualificação sem ter em conta que não é apenas ao valorizarmos uma formação reprodutora em que a comunicação só tem um único sentido, bloqueando os receptores, que se conseguem ultrapassar as dificuldades do presente.
Em termos da realidade do trabalho, a sociedade actual é caracterizada pela ocorrência de consideráveis modificações económicas e sociais; novos perfis profissionais não baseados na valorização conjuntural de competências relacionais adequadas aos novos cenários de incerteza, instabilidade e imprevisibilidade, não serão de forma alguma a solução.
Mas não basta termos a intenção de transformar qualquer coisa em realidade; é necessário que haja um propósito, um desejo concreto para que possamos dar corpo a esse projecto. É através dum projecto de vida que o Homem tem capacidade de se compreender e realizar em toda a sua plenitude. Como já Jean Paul Sarte dizia: «O homem só tem uma maneira de viver: através dum projecto», já que um projecto pode regular a nossa caminhada na busca da auto-realização, concretizando uma vida que vale a pena ser vivida e sendo assim uma determinante imediata da acção.
Um projecto revela um grau de maturidade estratégico-pedagógica e é sempre um instrumento metodológico, quiçá bi-etápico, que nos permite enfrentar os desafios com as nossas competências específicas.
Permite-nos ainda a tomada de responsabilidade no nosso próprio processo de formação e desenvolvimento sem que tenhamos a tentação de resvalar para formas magister ou, pelo contrário, puerpero-centradas que nos conduziriam a um reducionismo arcaico, mormente quando se configuram relações inter-disciplinares. É algo que se constrói, não que se reproduz, algo que arquitecta novos saberes, plurifacetados alicerçados em bases científicas e tomando em conta todas as variáveis em jogo.
Tomando nas nossas mãos a responsabilidade do nosso próprio projecto de auto-formação e desenvolvimento, fomentando a criatividade de auto-regulação, mais no sentido da flexibilidade do que da especificidade, teremos a capacidade de nos mentalizarmos das nossas necessidades e da forma como nos inter-relacionamos com os outros e com o mundo em geral e passar da intenção à acção.
E a intenção não é mais que o desejo. Não o desejo cego, que não passa pelo crivo da análise crítica, mas o desejo de construção de algo maior.
E se é o desejo/inspiração que dá sentido á acção, e por sua vez a acção que concretiza o desejo/inspiração. E o projecto é simplesmente a ligação entre a acção e a inspiração.
Para terminar, cito o que Platão diz sobre um tema ainda actual: «aquele que apenas executa os projectos concebidos por outros, é apenas um escravo»




Quem Canta seu Mal Espanta

O problema é que há por aí tanta gente desafinada! se começassem a cantar as coisas ainda iam ficar piores!



sexta-feira, 8 de abril de 2016

quinta-feira, 7 de abril de 2016

Reparem no cuidado com que ela compõe a sua "dignidade".
Nesta altura sim, tínhamos dignidade! Agora, sem "quépi"... para onde foi ela? Será que foi mis uma coisa que nos roubaram?

terça-feira, 5 de abril de 2016

IMPULSE...


E de repente, no meio de Nova Iorque (where else) quando o marinheiro soube que a guerra tinha acabado agarrou na primeira pessoa (desconhecida) que lhe apareceu e... ofereceu-lhe um beijo Foi Impulse, com certeza!
Teve sorte, digo eu, porque apanhou uma enfermeira... olha se lhe calha um jogador de basquete?? Provavelmente teria precisado duma enfermeira. sim, mas para lhe fazer massagem cardíaca ou respiração boca a boca... o que pensando bem, ia a dar no mesmo...

quinta-feira, 31 de março de 2016

E açim anda-mos nóz a excrever...

Tenho imenssas destas... não se hei-de rir ou xorar. A maior par-te das vezes deçido-me por rir, mas só porque rir é o melhor remédio e  pertantes faz bem ao curação!

quarta-feira, 23 de março de 2016

É que às vezes apetece!

Não Deixe Para Amanhã...

Às vezes, em sítios inesperados, passam pessoas inesperadas na nossa vida que inesperadamente nos marcam. Nem sempre por uma atitude grandiosa, ou por um gesto elevado, mas por pequenas coisas, pequenas palavras, pequenas histórias normais.
Foi o que aconteceu ontem na minha vida, às três da manhã (imagine-se), no hospital onde trabalho. Seja a que horas for que um doente saia da sala de operações, assim que, no recobro, a enfermeira considerar que ele está “bem”, calmo e acordado, manda descer a família para o ver e poder ficar descansada.
O doente que acabou a cirurgia, eram quase três da manhã, tinha 79 anos mas parecia mais velho, magro, com um aspecto debilitado e alguma dificuldade na fala. Quando a mulher dele desceu para o ver, confesso que achei que era a filha. Era uma senhora de 67 anos, e parecia menos. Aproximou-se do doente e começou a falar com ele com um carinho imenso, a dar-lhe beijinhos e festinhas, mas ainda assim continuei a achar que podia ser filha dele.
Eu, que andava por ali, a dar medicação, a fazer medições e registos e a responder às perguntas ansiosas sobre a cirurgia, acabei por ficar apoiada do outro lado da cama, a conversar com ela. Não me atrevi a perguntar qual a relação de parentesco entre os dois mas ela acabou por ma revelar. E começou assim, dirigindo-se a ele:
— Tivemos trinta anos muito bons, não foi António? Fizemos tantas coisas juntos, gozámos tanto a vida...
O doente ia acenando que sim e respondendo no mesmo tom de ternura com que ela falava com ele.
— Nunca casámos... nem vamos casar agora, não é?
Achei que aquela declaração/pergunta não era bem para ele, era também para mim, para eu ficar elucidada. Se calhar ela percebeu que eu estava curiosa. Ou provavelmente não foi a primeira vez que a teve que explicar. E como uma das coisas que mais gosto na minha profissão são as relações humanas que estabelecemos nem que seja por alguns minutos e a possibilidade de, ao conversarmos e brincarmos, podermos tranquilizar um pouco as pessoas que estão numa situação tão fragilizada, perguntei porquê. Ela explicou-me o que todas as pessoas que não querem casar explicam: que acham que um papel pode estragar tudo.
Não me competia discutir o assunto e aliás nem teria tido oportunidade de o fazer porque ela já me estava a contar a história dos dois.
Ambos tinham sido casados antes de se encontrarem, casamentos problemáticos, dos quais tiveram dois filhos cada um. Quando se conheceram, ambos deram devagar os passos que os conduziram um para o outro. Ele bastante mais velho que ela, uma pessoa calma e tranquila “mas um galã, com uma namorada em cada cidade”, ela mais nova, alegre e divertida mas de “pêlo na venta”. O oposto um do outro, mas a verdade é que os opostos se completam.
Acabaram por ir viver juntos com a advertência dela que “Se eu desconfio sequer que há mais alguma na tua vida, nesse mesmo momento estás com as malas à porta! “.
Vinte e nove anos e nenhuma “outra na vida dele” mais tarde, há mais ou menos um ano, ele teve um AVC grave, do qual conseguiu recuperar muitas das funções uma vez que não falava nem andava e hoje, com alguma dificuldade, é certo, mas faz as duas coisas.
Até aqui a história não tem nada de especial, certo?
Especial – pelo menos eu achei – foi o que ela me disse a seguir:
— Sabe? – perguntou – nós os dois tivemos uma vida abençoada. Claro que tivemos os “nossos momentos, as nossas birras” mas sempre nos demos muito bem, e criámos, para além do amor uma enorme amizade. E sabe?, fizemos tudo o que queríamos! Não deixámos nada por fazer, nem deixámos nada para amanhã! Saber que aproveitámos tudo o que se nos deparou, desfrutámos de todos os momentos, hoje que o António está assim, dá-me uma grande tranquilidade, uma grande paz.
Não tenho a certeza da razão porque estas palavras, ditas daquela forma simples e sem pretensões, me tocaram. Talvez porque nós – os outros, a maior parte das pessoas – deixamos tanta coisa para amanhã, não conseguimos gozar hoje e agora, sempre a pensar no que pode acontecer amanhã.
Um amanhã que pode virar a nossa vida do avesso e fazer-nos olhar para trás com pena ou remorso de não termos gozado aquela boa fase, dia, hora ou minutos que a vida nos ofereceu “de graça”.
Um amanhã do qual podemos nem sequer despertar!
Agora, a escrever estas palavras, surgiu-me a ideia que a razão pela qual as palavras dela não passaram por mim sem deixar marcas, foi... um bocadinho de inveja!

sexta-feira, 4 de março de 2016

ORTOTANÁSIA - UMA NOVA MANEIRA DE PENSAR A MORTE



"Cada vez mais, as nossas tarefas serão de acrescentar vida aos anos a serem vividos e não acrescentar anos à nossa vida... dando mais atenção ao doente do que à cura em si mesma."



Se a morte faz parte do ciclo da vida humana, então deveria ser entendida e esperada como o último resultado deste esforço, implícito e inerente desde o princípio. Quando nos esquecemos disso, acabamos por cair na tecnolatria e na absolutização da vida biológica pura e simples. adiando o inevitável, que apenas acrescenta sofrimento e vida quantitativa, sacrificando a dignidade.
O crescente interesse público em torno da eutanásia e suicídio assistido, chama a nossa atenção para os limites do "curar" da medicina moderna.
Referindo-nos sempre ao doente terminal, os profissionais de saúde e os doentes devem saber que é lícito conformarem-se com os meios normais que a medicina pode oferecer, e que a recusa dos meios excepcionais ou desproporcionados não equivale ao suicídio ou à omissão irresponsável da ajuda, devida a outrem.
Essa recusa pode significar apenas a aceitação da condição humana, que se caracteriza também pela inevitabilidade da morte, ou seja aquilo a que se convencionou chamar Ortotanásia.
A Ortotanásia consiste em renunciar a meios extraordinários e dispendiosos, já inadequados à situação real do doente, porque não proporcionam os resultados que se poderiam esperar. Nestes casos pode-se interromper a manutenção artificial da vida quando não há mais meios de recuperá-la devido a uma patologia irreversível.
Muitos bioeticistas, entre os quais Gafo (Espanha), utilizam o termo ortotanásia para falar da "morte no seu tempo certo".
A ortotanásia, ao contrário da eutanásia e da distanásia, é sensível ao processo de humanização da morte e alívio das dores e não incorre em prolongamentos abusivos com a aplicação de meios desproporcionados que imporiam sofrimentos adicionais.
Mas o que é que constitui o prolongamento ilícito da vida e o que constitui um abreviação ilícita da mesma?
Noutras palavras, como é que podemos, por um lado distinguir entre a eutanásia e a distanásia, e por outro lado deixar o doente morrer em paz e com dignidade?
A resposta está na distinção entre os «meios proporcionados e «meios desproporcionados» e no seguinte princípio: não somos obrigados a utilizar meios desproporcionados – sempre e quando respeitarmos os desejos dos doentes – mas estamos obrigados a utilizar sempre «meios proporcionados». .
Utilizar meios desproporcionados sem respeitar os legítimos desejos dos doentes, é distanásia.
Não utilizar ou retirar meios proporcionados é eutanásia

Desproporcionados são os meios cuja carga é superior aos benefícios. São aqueles que são inúteis para conservar a vida do paciente, ou que, para curá-lo, constituem uma carga demasiado grande em termos de dor e sofrimento para o doente. Um doente tem o direito de recusar um tratamento – uma radioterapia por ex. se assim o decidir.
E é ainda preciso ter em conta que um tratamento que é proporcionado para um doente pode ser desproporcionado para outro.
Na aplicação destes princípios devemos actuar caso a caso.
Isto implica que não é possível dar uma lista de meios proporcionados e desproporcionados sem ter em conta o efeito desses meios num determinado paciente, aqui e agora. Em cada caso dever-se-ão valorizar bem os meios pondo em comparação o tipo de terapia, o grau de dificuldade e risco que comporta, com o resultado que se pode esperar de tudo isso, tendo em conta as condições do doente, as suas forças físicas e morais.
Um novo conceito que começa agora a ganhar força. Hellegers, um dos fundadores do Instituto Kennedy de Bioética, a respeito desta questão, afirma: "Perto do fim da vida, uma pretensa cura significa simplesmente a troca de uma maneira de morrer por outra..

É este desafio ético que a medicina e a sociedade, têm que enfrentar com urgência : o de humanizar a vida no seu ocaso, devolvendo-lhe a dignidade perdida.
É o paradigma do cuidar substituindo o do curar que aceita o declínio e a morte como parte da condição do ser humano, uma vez que todos sofremos de uma condição que não pode ser "curada", isto é, todos somos criaturas mortais.

Porque, queiramos ou não, reconhecendo-o ou não, à medida que os serviços de saúde se foram tornando mais dependentes da tecnologia, foram deixadas de lado práticas humanistas, tais como manifestação de apreço, preocupação e presença solidária com os doentes. O "cuidar" surge no mundo tecnológico da medicina moderna simplesmente como prémio de consolação quando o curar não é possível.
Mas cuidar permite-nos realisticamente enfrentar os limites da nossa mortalidade e do poder médico com uma atitude de serenidade praticando uma medicina orientada para o alívio do sofrimento que está sempre mais preocupada com a pessoa doente do que com a doença da pessoa. É sob tal foco, que relação dos profissionais de saúde, nomeadamente os enfermeiros, com o doente, adquire, grande importância.
Cuidar dignamente de uma pessoa que está a morrer num contexto clínico, significa respeitar a integridade da pessoa. Pretende garantir que o paciente seja mantido sem dores tanto quanto possível, que receberá continuidade de cuidados e não será abandonado ou sofrerá perda de sua identidade pessoal. Pretende garantir que o paciente terá tanto controle quanto possível no que se refere às decisões a respeito do seu cuidado e ser-lhe-á dada a possibilidade de recusar qualquer intervenção tecnológica que prolongue a sua "vida", uma vez que será ouvido como uma pessoa com os seus medos, pensamentos, sentimentos, valores e esperanças. Pretende garantir ainda que poderá de morrer onde quiser morrer.

Nesta nova perspectiva deparamos com o difícil desafio, de aprender a encarar o cuidar da vida humana no sofrimento do adeus final, situado entre os dois limites opostos: por um lado a convicção profunda de não matar e por outro, a visão de não procrastinar ou adiar pura e simplesmente a morte.
Por isso é orbigatório reflectir sobre a questão de definir de quando é preciso desistir e aceitar o que é irreversível, intensificando os nossos esforços no sentido de amenizar o desconforto do morrer.
"Curar às vezes, aliviar frequentemente, confortar sempre.” (Oliver) é cada vez mais importante na missão de qualquer profissional de saúde










quinta-feira, 3 de março de 2016

DISTANÁSIA: PROLONGAMENTO EXAGERADO DA VIDA



O termo "distanásia" é pouco conhecido e utilizado na área da saúde, ao contrário da eutanásia, amplamente discutido e estampado nos noticiários e jornais, apesar de sem dúvida, ser uma opção bem menos praticada do que a "distanásia" nas nossas instituições de saúde, nomeadamente nas unidades de cuidados intensivos, as modernas catedrais do sofrimento humano

Distanásia  é etimologicamente o contrário da eutanásia. Trata-se de um neologismo de origem grega. O prefixo grego dis significa "afastamento", e “thánatos”, morte, donde a distanásia significa prolongamento exagerado da vida de um paciente, referindo-se sempre ao doente terminal, perante a eminência de uma morte inevitável.
Outra definição, define distanásia como: "Morte lenta, ansiosa e com muito sofrimento". O termo também pode ser empregado como sinónimo de tratamento inútil.

Trata-se, em suma, da atitude médica que, visando salvar a vida do paciente terminal, atrasa o mais possível o momento da sua morte, usando para isso todos os meios, proporcionados ou não, mesmo que não haja esperança alguma de cura, e ainda que isso signifique infligir ao moribundo sofrimentos adicionais, que, obviamente, não conseguirão afastar a inevitável morte, mas apenas atrasá-la horas, dias ou meses. O que quer dizer que não se prolonga a vida propriamente dita, mas o processo de morrer. No mundo europeu fala-se de "obstinação terapêutica", nos Estados Unidos de "futilidade médica" (medical utility).

Desde a antiguidade, nomeadamente com Platão, Sócrates, e Aristóteles, a vida era considerada como uma aprendizagem da morte, sendo uma das funções da filosofia preparar-nos para uma «boa morte». Supunha-se que aquele que sabia morrer, tinha aprendido a viver e assim a vida e a morte iluminavam-se reciprocamente. Mas não é preciso ir tão longe: basta-nos olhar para a primeira metade do século XX, para constatar que hoje em dia já não se morre como antigamente. Dantes (ontem, ainda) morria-se em casa. Era a morte domada. O ser humano sabia quando ia morrer pela presença de avisos, sinais ou convicções internas. A morte era esperada no leito, e era autorizada pela presença de parentes, vizinhos, amigos e até crianças. Havia uma aceitação dos ritos, que eram compridos sem dramatização. Era algo familiar, próximo, em que os que a aguardavam – doentes e familiares – se conheciam muito bem e partilhavam valores. Assim podiam dar ao moribundo todo o conforto – nos seus variados aspectos – que alguém no limiar da vida, tanto necessita.
Pelo contrário, hoje, praticamente a quase totalidade das mortes ocorre no hospital. A hospitalização, as unidades de cuidados intensivos e os transplantes, alteraram radicalmente o conceito de morte e de morrer. O desenvolvimento da tecnologia, as técnicas e procedimentos que dão aos profissionais de saúde novos poderes para retardar ao máximo a hora da morte, levaram-nos a uma interpretação errónea de que a morte pode, quase sempre ser adiada.
E quanto mais de ponta for a instituição de saúde, tanto mais possível e sofisticada pode ser a Distanásia, embora, seja importante assinalar que nos hospitais dos países mais desenvolvidos existe uma consciência bem mais lúcida de limite, ao nível do investimento tecnológico na fase final da vida. Na cabeceira das camas dos doentes irrecuperáveis constam indicações tais como NR (não ressuscitar), pedidas pelos próprios doentes quando estão (ou estavam) ainda lúcidos.


À primeira vista, poderíamos ingenuamente pensar que a morte nas mãos da moderna tecnologia médica seria um evento menos sofrido, e mais digno do que o foi na antiguidade: não temos maior conhecimento científico, analgésicos poderosos, que aumentam a possibilidade de controlar a dor, máquinas mais sofisticadas, capazes de substituir órgãos que entram em disfuncionamento?
Não temos maior conhecimento psicológico, um instrumento precioso no sentido de aliviar as ansiedades e o sofrimento de uma morte antecipada? 
Não temos exactamente tudo, o que necessitamos para tornar realidade, a possibilidade de uma morte digna e em paz?
A resposta pode ser sim e não. Sim, temos muito mais conhecimento que tínhamos anteriormente. Mas não, este conhecimento não tornou a morte um evento digno. O conhecimento científico e tecnológico serviram também para tornar a nossa morte mais problemática, mais difícil de prever, mais difícil ainda de lidar, fonte de complicados dilemas éticos e escolhas dificílimas, geradoras de angústia, ambivalência e incertezas.
A medicina cujo objectivo é a busca da saúde, procurando aumentar o tempo de vida e a sua qualidade, fomentou implicitamente um culto idólatra da vida, organizando a sua fase terminal como uma luta a todo o custo contra a morte e alimentando a tendência para prolongar a vida em condições inaceitáveis.
Esta idolatria da vida ganha forma na convicção de que a inabilidade para curar ou evitar a morte, é uma falha da medicina moderna. A morte é admitida com relutância, encarada, a barreira que lhe permite para atingir os objectivos.
A falácia desta lógica é que a responsabilidade de curar termina quando os tratamentos se esgotam.
É necessário que se reconheça que em alguns casos se chega a um ponto em todas as vidas, em que nada pode ser feito em benefício dos doentes, excepto mantê-los confortáveis e sem dores porque no fim, a morte acaba por chegar e vencer.
Convém a todos os profissionais de saúde cuja formação é totalmente virada para a manutenção e preservação da vida a qualquer custo, reflectir sobre o sofrimento que inutilmente se acrescenta a uma agonia programada por uma terapêutica já inútil e somente utilizada para cumprir o dogma médico de "fazer tudo o que for possível para conservar a vida" - o qual, interiorizado de maneira acrítica por alguns, é aceite como princípio ético que não exige maior discussão e normalização. Se a morte faz parte do ciclo da vida humana, então deveria ser entendida e esperada como o último resultado deste esforço, implícito e inerente desde o princípio. 
E quando nos esquecemos disso, acabamos por cair na tecnolatria e na absolutização da vida biológica pura e simples. É a obstinação terapêutica adiando o inevitável, que apenas acrescenta sofrimento e vida quantitativa, sacrificando a dignidade com que nos assiste na morte.